segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

UMA HISTÓRIA DE FUTEBOL - CRÔNICA

Santa Vitória do Palmar, década de 70. O Arroio Grande foi jogar contra o Brasil local e o Osca, que se tornaria o maior goleiro da história do futebol amador do Estado, chega à cidade sem condições de jogo. O seu reserva imediato, acreditem ou não, era o folclórico Papaquinho, apesar do seu pouco mais de metro e meio de altura. Desespero, insegurança, mas não houve jeito e o Papaco acabou mesmo tendo que ir pro jogo.
Começa a partida e o Brasil - dos terríveis irmãos Cláudio e Sérgio, dois Alemães que tinham uma patada nos pés – ataca o tempo todo. A bola não para de rondar a área do Saci e o Papaco reza pra que nenhum chute acerte o seu gol.
Jogo vai, jogo vem, e o Juiz acaba marcando um pênalti pro time da casa. Reclama daqui, discute dali, e o Osca, que havia ficado no banco de reservas mesmo sem poder jogar, aproveita a confusão, vai até o Papaco e diz: - “Quem bate é o Cláudio, o n° 10; ele sempre atira no lado direito do goleiro. ‘Voa’ pra lá que tu pega”.
O Papaco, que já vira duas bombas do Alemão estourarem bem perto dele, que ‘tava com diarréia e dor de cabeça desde que soube que iria jogar, pensou, naquele instante, na vida que levava no Arroio Grande, na cervejinha à noite, nos bailes de campanha, nos amigos de infância - o Toninho do Evaema, o João Antônio... - “Porque isso tinha que acontecer logo comigo?!” – resmungou, olhando pra cara desconfiada do Wilson do Ary, enquanto estudava o que fazer.
Espiou pr’um lado e viu a “massa” do Brasil vibrando ante a iminência do gol. No outro lado, o Osca sussurrando: “No teu canto direito, no direito...” Olhou pra trás e ainda teve tempo de ver o Neco Peru gozando: - “Pega agora, engraçadinho!” - disse o Neco, morrendo de rir do terror que ‘tava passando o Papaquinho, que vivia de zombar dos outros.
Por último, olhou pra frente e viu o Alemão de pernas grossas, “O canhão dos Mergulhões” como era chamado, e quando o Juiz apitou e o Cláudio disparou um dos mais potentes chutes que Santa Vitória já viu, o Papaco não teve dúvidas, contrariou o Osca e se jogou como um boneco inflável pro canto... esquerdo. A bola viajou por uma fração de segundo, procurando o ângulo, e deu o maior estouro quando acertou a orelha direita do Goleiro até sair pra escanteio.
O Papaco ficou caído, quase desmaiado, e sobre ele um amontoado de jogadores do Arroio Grande, inclusive o Osca que invadira o campo pra comemorar: “Tu adivinhou o canto, tu é melhor do que eu, melhor que eu!” – gritava eufórico, abraçado ao amigo.
O jogo terminou 2 X 1 pro Arroio Grande e o Papaco até hoje mal recorda do que aconteceu. Só lembra que passou o resto da partida tentando falar com o Alemão Cláudio, “O canhão dos Mergulhões”, até que, numa saída de bola, conseguiu passar o recado que queria: - “Se tiver outro pênalti e tu trocar de canto de novo eu te mato, desgraçado!” – teria dito, levantando a mão pra coçar a orelha que não parava nunca de incomodar...

Pedro Bittencourt Jr.

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